7 de maio de 2010

Perguntas sem respostas (redação 01)



“Policiais Militares Rodoviários (PRE) de Ponta Porã MS, em fiscalização na data do dia 07/10/09 às 02h20min, em frente à Base Operacional da Polícia Militar Rodoviária, ao abordar o veiculo GM S10, de placas IPS 8414 de Boa Vista do Cadeado RS, conduzido pelo Senhor XXX e a passageira XXX, após vistorias no veículo foi encontrado no estepe 14 tabletes de cocaína. Diante dos fatos o mesmo foi preso em flagrante e cientificado de seus direitos constitucionais e entregue na Delegacia de Polícia Civil de Ponta Porã-MS, juntamente com a droga apreendida, que depois de pesada totalizou 19,900Kg (dezenove quilos e novecentos gramas), para providências junto à autoridade competente.” 

(Fonte: Nota à imprensa de 07 de outubro de 2009, Assessoria de Comunicação Social da PMMS/PRE)
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Pergunto: segundo o texto, 
  1. o que os Policiais fizeram?
  2. quem conduziu o veículo em questão?
  3. quem foi preso?
  4. o que foi encontrado?
  5. quem foi entregue na Delegacia?
  6. quanto pesou a droga apreendida antes de ser pesada?
Responder rigorosamente estas 6 perguntas é uma graça. Vejamos 

1. O que os Policiais fizeram?
    Nada.
    Os policiais são o sujeito da frase. Sujeito é aquele que faz alguma coisa. Ele pode correr, atirar, balear, dormir, estar desatento, fugir, até morrer. Qualquer coisa. Mas precisa fazer para ser sujeito. Estes policiais não fazem nada. Afinal, “ao abordar” e “após vistorias” são circunstâncias nas quais os policiais pretendiam atuar ou atuaram, e  seu comunicador social não foi capaz de encontrar palavras para nos descrever esta suposta atuação. Provavelmente os policiais encontraram algo. Alguém outro, porém, encontrou por eles. Algum sujeito na voz passiva nos omitido. Tirando as circunstâncias, a frase ruma para o seguinte abismo:
    Policiais Militares Rodoviários (PRE) de Ponta Porã MS foi encontrado no estepe 14 tabletes de cocaína.
    Cruzes! Existe nota abaixo de zero?!

2. Quem conduziu o veículo em questão?
    Duas pessoas. (Pode ter sido um carro de auto-escola?)
    Diz a frase, claramente, porém bem escondidinho num turbilhão de circunstâncias caóticas: “…ao abordar o veiculoGM S10, de placas IPS 8414 de Boa Vista do Cadeado RS, conduzido pelo Senhor XXX e a passageira XXX…” 

3. Quem foi preso?
    O pneu de socorro.
    Infelizmente isto está claro demais: “… após vistorias no veículo foi encontrado no estepe 14 tabletes de cocaína. Diante dos fatos o mesmo foi preso em flagrante e cientificado de seus direitos constitucionais …” 

4. O que foi encontrado?
    Nada
    Ao menos a rigor - nosso legítimo rigor com respeito a um bacharel em comunicação social. Temo que este não nos entenderá, portanto nos explicamos. Se ele nos informa que “foi encontrado” algo, podemos com toda razão gramatical esperar uma unidade. Isso não significa que deva ser pouco ou pequeno. Pode ser um milhar de tabletes, um quilo de maconha. Mas fala de “14tabletes de cocaína”. Em termos de gramática (e de lógica gramatical), “foi encontrado” e “14 tabletes” nada tem a ver. Eles nada têm a ver um com o outro.

5. Quem foi entregue na Delegacia?
    O preso (que é o pneu, como vimos acima) e o entorpecente.
    Em momento inoportuno, o comunicador social reencontrou a coerência que de resto lhe foge. Prendeu o pneu e evidentemente o entregou na delegacia: “Diante dos fatos o mesmo foi preso em flagrante e cientificado de seus direitos constitucionais e entregue na Delegacia de Polícia, juntamente com a droga apreendida.” 
    O pneu roda, mas o comunicador social também rodaria.

6. Quanto pesou a droga apreendida antes de ser pesada?
    Não sabemos.
    E, a princípio, nem queremos saber. Não queremos saber quanto a maconha pesou antes nem depois de pesada. Queremos talvez saber quanta maconha foi encontrada. 
    Já que o comunicador social coloca as coisas nestes termos: quanto pesou mesmo a maconha antes de pesada? Imagine se aparecer uma diferença!
    Depois de pesado é um preciosismo que castiga quem o usa.

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    A) Escrever bem significa estar atento ao que se escreve e revisar o que se formulou. Ninguém escreve bem sem revisar. Sempre dá para melhorar. E muito!
    B) Acertar a acentuação gráfica no português significa seguir a seguinte e simples orientação: As palavras portuguesas terminadas em a, e, o, am e em têm sua tônica natural na penúltima sílaba. As demais, na última. (Vale também para os plurais de ambos os grupos.) Sempre que a tônica se deslocar da tônica natural, incide acento gráfico.
    C) A virgulação no português é complicada e (infelizmente) muito discutível. A lógica ajuda a acertá-la. Aqui vamos tratar também dela.
    Ah! Ia me esquecendo da deusa gramática! Esta fica de lado o quanto possível. Dificuldades na escrita pouco se devem à falta de conhecimentos gramaticais e muito ao vício copiado de outros, ao desleixo e ao desinteresse. 3 malandros substituíveis pelo vício da perfeição, da vontade e do interesse.

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